segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Miguel


- Miguel. Ela disse do outro lado da linha

Aquele não era nem de longe o nome dele, mas ele sabia, aquilo era alguma coisa que ela queria dizer.
Ela nunca começava uma conversa com "alô" ou "oi, tudo bom?".
No começo ele estranhava atender o telefone e ouvir "eu ainda mato um imbecil hoje" ou "meu reino por uma capa de chuva" num dia de sol. Mas aos poucos ele foi se acostumando.
E hoje depois de ouvir isso ele deu uma mordida no sanduíche que insistia em querer ser o almoço dele, e respondeu:

- Hã?

Porque ele tinha se acostumado com os não-alôs, mas isso não significava que ele já entendesse tudo o que ela queria dizer.

- É, Miguel. O que você acha?
- Bem, se eu soubesse do que se trata eu poderia dar uma opinião.
- Miguel é um nome bonito não é?
- Não é feio.
- Então, ele é da milicia celeste. Achei mó legal isso. Anjão sabe?

Ele viu que só o sanduíche não ia bastar, e pensou seriamente em trocar por algo mais forte, absinto por exemplo, porque com certeza ela já tinha tomado umas vinte doses.. Ou não. Ele sempre soube que ela nunca precisou beber pra ter idéias loucas, ele sim, com certeza precisava, pra entender. Mas tentou continuar sóbrio, pois a tarde de segunda feira ia durar mais que aquele telefonema. Pelo menos ele esperava que durasse...

- Ok. Anjão. Não é feio o nome e o cara é um anjo. Você está tentando me dizer alguma coisa?
- Seria um bom nome pro nosso filho você não acha?

Ok. Agora ele tinha certeza que precisaria de todo o absinto da face da Terra.

- Hã?
- Poxa, você não acha?
- Você tá grávida, é isso?
- Nem...
- E porque mesmo você ficou pensando em um nome para um filho que nem existe?
- Ah por nada, achei Miguel bonito, só isso.
- Eu já te disse que você é doida... Essa semana?
- Essa semana não.  Até porque hoje é segunda né?
- Você é doida.
- Eu também te amo.
- Como sempre.
- Uhum.
- E para sempre.
- Talvez.

E desligaram. Sem tchau.


Ela voltou a se matar com aquelas planilhas, ele deu mais uma mordida no sanduíche, pensando que Miguel talvez fosse realmente um nome bom...
E cada um do seu lado deu um sorriso, certos de que nunca cansariam de se entender tanto, mesmo sempre se estranhando.

2 comentários:

Renata Schmitd disse...

vc poderia escrever mais

M. disse...

:) Vou tentar, prometo!