quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A Segunda Grande Merda


Toda grande merda precisa de duas coisas: ócio e criatividade.

E digamos que isso nunca me faltou.

Alguns anos depois da Primeira Grande Merda, minha mãe resolveu ir ao centro da cidade e me deixar em casa sozinha com a minha irmã, na época eu tinha uns 6 (7,8) anos e ela 16 (17,18).

Eu fiquei realmente brava, porque adorava ir ao centro da cidade. Sempre achava uma longa viagem (de 15 min) e dormia no onibus, no colo da minha mãe. Chegava lá, enchia o saco pra lanchar nas Lojas Americanas ou na Mesbla e depois de comer enchia o saco pra ir embora (afinal, nasci e morrerei gordinha). Bem, talvez por isso minha mãe tenha resolvido me deixar em casa...

Como eu já disse, minha familia sempre morou muito perto. A familia do meu pai mora toda em um único terreno. Nessa ordem: minha casa - casa do meu tio - casa da minha tia. E na época nossos quintais eram abertos, interligando as três casas e um terreno gigante que antes era uma chácara.

Minha tia tem problemas de saúde e por isso meu tio contratou uma familia, que cuida dela. Na verdade não precisava ser uma familia, mas meu tio achava que, já que ela tem uma casa, pra não ficar vazia, poderia ajudar uma familia toda, ao invés de contratar uma enfermeira só. Ai sei lá... Só sei que o filho dessa moça que cuidava da minha tia tinha também seus 16 anos e estava de conversê com a minha irmã, na casa da minha tia e eu lá entediada olhando pros dois...

Até que me entediei demais e falei com ele: "vamos brincar de pique-esconde?"

Juro que ouvi ele dizer "tá, tá". E por isso sai correndo para me esconder.

Provavelmente ele nem ouviu o que eu disse, e falou o "tá, tá" para eu calar a boca... E diria isso se eu pedisse um milhão de dolares...

Fato é que sai correndo e me escondi. Atrás de uma poltrona do quarto da minha mãe. E fiquei lá.

Minha irmã só percebeu que eu tinha sumido quando a minha mãe chegou. Porque ficar comendo jambo (ou jabuticaba, ou siriguela, ou caju, ou goiaba, ou jaca, ou manga, ou qualquer fruta que tivesse no quintal) devia estar mais legal do que reparar que a irmã tinha desaparecido.

Eu estava realmente puta da vida porque ninguém tinha me achado e já estava me preparando pra sair quando ouvi alguém gritando por mim com aquele tom de voz "vou te matar" e lembrei "se eu sair agora, tomo esporro, se eu demorar eles ficam preocupados e eu me safo", tal como na primeira grande merda. Vão pensar ou que eu fugi, ou que morri, ou que me roubaram (acho que não sabia o que era sequestro ainda) e quando eu aparecer vão ficar tão felizes por eu estar viva, que não vão brigar tanto comigo".

Resolvi então esperar que ficassem bem preocupados por mim. Dei até uma cochiladinha atrás da poltrona, de tanto que fiquei por lá.

Quando acordei, só ouvia gente gritando, gente chorando, telefone tocando. Até que percebi que tinha muita gente falando, e muita gente chorando... Devia ter no minimo umas 20 pessoas na minha casa... E comecei a prestar atenção no que diziam, até porque com toda aquela fuzaca eu já não conseguia cochilar mais...

Me dei conta de que minha mãe já tinha ligado até para a policia, achando que eu tinha sido sequestrada. Tirou meu pai do trabalho e mandou ele correr pra casa, ele que na época estava sem carro estava voltando pra casa de ônibus pra ver o que tinha acontecido (ele estava sem carro mas eu acho que não era culpa minha não...afinal nessa época ja tinha dado tempo dele consertar o estrago da Primeira Grande Merda). Já tinha perguntado de mim para todos os vizinhos, que logo depois já estavam na minha casa...

E pensei, "ok, acho que tá bom né? Mas e agora, como eu saio daqui?" Não podia simplesmente aparecer na copa e dizer "tchanãããã", porque ia matar metade daquelas velhas de susto. Sinceramente, fiquei meio sem jeito de sair depois que vi a comoção que eu causei. Tinha que ser algo mais dramático do que aparecer com cara de sono, bocejando e perguntando "o que aconteceu por aqui? é festa?"

Esperei então, por mais uma hora aproximadamente. Até a hora que minha mãe resolveu ficar um pouco sozinha no quarto, rezando pros santinhos dela que ficavam no criado mudo. Ela sentou de um lado da cama e eu fui me arrastando até o outro lado e fiquei escondida atrás da cama, só aparecendo o olhinho pra ver se ela me reparava. Levantava e abaixava... Fiquei um tempão fazendo isso... E ela não dava bola. Depois ela disse que achava que eram as outras crianças que estavam lá em casa, brincando, porque tinha uma penca por lá.

Foi uma cena tocante quando ela se deu conta de que era eu do outro lado da cama. Sabe quando a pessoa se vira, acha que não viu nada e depois tem que olhar de novo pra conferir se é verdade mesmo? Foi bem assim... E ela me abraçava tanto, chorava tanto que fiquei até meio arrependida de ter feito isso com ela. Talvez eu devesse ter ficado no meio termo entre, o "só me escondi" e o "desapareci por 5 horas". Mas né? Meio termo nunca foi o meu forte...

E ela me levou no colo pra sala como se eu fosse um troféuzinho, chorando e feliz... Todo mundo perguntando onde eu tava, de onde eu apareci, o que tinham feito comigo.

Eu disse que tinha dormido atrás da poltrona e não ouvi ninguém me chamar. Que estava brincando de pique-esconde com o Coelho (cujo nome era Paulo, sem sacanagem...) e ele não me achou. Lógico que ficaram putos com ele. Afinal, quem faz isso com uma criança? Deixa ela escondida por horas? Só um monstro.

E lógico que não adiantou nada ele dizer que eu, na verdade, estava brincando sozinha, uma vez que ele não foi avisado que estava brincando comigo. Apesar de todos os esforços dele, a cara de reprovação das tias velhas por ele ter feito isso comigo foi espetacular...Afinal ele era o adulto, ele tinha mais culpa que eu.

E todo mundo me abraçou, me beijou...

E eu ganhei muitos presentes. Entre eles um óculos gatinha da hello kitty foférrimo. Que usei no dia seguinte pra ir à praia, mas meu primo ficou meio bravo, como podem perceber na foto abaixo, pois essa merda eu fiz sozinha.


"só te abraço depois que eu forjar meu sequestro também"


terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A Primeira Grande Merda


Que eu já fiz muita merda nessa vida, não é novidade pra ninguém. Todo mundo fez, na verdade, eu só resolvi enumerar as minhas merdas mais significativas, e contar como elas aconteceram.

Nessa particularmente eu tive um parceiro no crime. Meu primo. Aquele doente. Lembram dele? Então, esse mesmo. E essa minha primeira grande merda me deu tudo o que eu precisava para a segunda grande merda (mas isso já é um outro post).

Toda a minha família sempre morou perto. E é assim até hoje. Tanto os irmãos do meu pai, quanto da minha mãe. O que sempre me frustrou um pouco, pois passar férias na casa dos tios era literalmente atravessar a rua, no máximo andar um quarteirão. E com isso imagina o fuzuê que sempre foi minha casa. Como não tinha portão, a gente nunca sabia quem estava por ali... Do tipo acordar e ver primo reclamando “pô, não tem queijo nessa casa não?” enquanto fechava a geladeira e fazia um sanduiche com Nescau, com o último copo de leite, me deixando sem café da manhã (e eu não sei ao certo dizer se isso aconteceu em 1989 ou semana passada)...

Um belo dia, todo mundo por ali, e eu e meu primo sem ter o que fazer... Meu pai tinha um fusquinha branco, que ficava estacionado na varanda. Varanda essa que é a única entrada da casa, o que fazia ele estacionar o carro um pouco torto, para as pessoas poderem passar mais confortáveis e do muro - sem portão - até a varanda tem uma pequena ladeirinha. Estou falando isso para vocês visualizarem a cena do crime.

Voltando... Eu e ele sem ter o que fazer. Não sei como, descobrimos que o carro estava sem o freio de mão puxado... Ok, a gente não fazia idéia do que era um freio de mão. Descobrimos na verdade que: “óóó a gente encostou no carro e ele andou, que massa”

E eu não sei realmente se a gente confabulou alguma coisa, ou só nos entreolhamos e começamos a empurrar. Eu só sei que tínhamos, no máximo 5 anos, e aquele fusca estava mais pesado que uma Scania. Ficamos horas a fio empurrando, empurrando e empurrando. Literalmente. Sério, foi muito demorado e cansativo. E eu não sei como não notaram, ou não sentiram nossa falta. Mas sinceramente? Se nos viram e nos subestimaram, bem feito por duvidar da nossa força. E se não perceberam nossa ausência, bem feito, por serem péssimos pais.

Ao fim de uma longa jornada de trabalho, conseguimos!!! Empurramos o carro ladeira abaixo! E ficamos realmente felizes ao terminar o trabalho de ‘empurro’ pois ia ser lindo vê-lo parar no fim da ladeira, ou no meio da rua. Estávamos pulando de felicidade, com os bracinhos pra cima e rodopiando na ponta dos pés saboreando o doce sabor da vitória, quando ouvimos um estrondo.

...Lembra que meu pai deixava ele meio torto? Pois então.

...O resultado foi que destruímos um carro... e um muro.

Eu acho que nunca na minha vida eu devo ter feito uma cara de “fudeu” mais “FUDEU” do que a que eu fiz nesse dia. Eu realmente não lembro muito bem a minha reação, mas acredito que ficamos paralizados, de bracinhos pra cima e na ponta dos pés mesmo.
Em 30 segundos apareceram 80 pessoas que não passaram por nós em mais de 1 hora. Eu não tinha sequer noção de que tinha tanta gente na minha casa...

- o que vocês fizeraaaaam meu Deeeeus????” (cara do quadro ‘O Grito’)
- a gente só empurrou. (cara de gato de botas do Shrek)

As frases a seguir vieram de várias pessoas que estavam presentes, enquanto eu repetia baixinho respondendo à todas com “a gente só empurrou, assim ó...” (e fazia o gesto com a cara de esforço inclusa. Afinal tinha dado um trabalhão)

- Só empurraraaaaaaaaaaam? Só empuraaaaaaaaaaaraaam? (Só...)
- Não é possível, alguém ajudou vocês a fazerem isso. Quem foi??? Vocês não fizeram isso sozinhos... (O tia, duvida não hein, vem querer dar os louros pra sua filha não)
- O que vocês pretendiam com isso??? (Nada...Empurrar um carro.)

Até que alguém falou uma frase que mudou toda a situação, que até então, estava bem desfavorável para nós...

- Ainda bem que não tinha um empurrando e outro puxando. Senão um dos dois estaria ou atropelado, ou entre o carro e o muro.

Sabe o que é todo mundo calar a boca em 2 segundos? Foi o que aconteceu. Porque ninguém tinha se dado conta disso. Duas crianças, um carro e um muro. A chance de alguém morrer era bem significativa.

E do “o que vocês pretendiam com isso?” começamos a ouvir “nossa você está bem?”, “machucou não?”, “ai graças a Deus que foi só o carro” (mãe é sempre otimista) “...e o muro né tia?” (mas sempre tem uma prima que quer piorar as coisas pro seu lado)

O fato é que começaram a abraçar a gente, e a falarem que não poderíamos ter feito aquilo porque a gente poderia se machucar. E levamos uma bronca fofa estilo “não pode porque machuca”. Que convenhamos é melhor do que a bronca estilo, “Você está vendo a merda você fez com o meu carro? Tá vendo a merda??? Tá vendo a merda????”.

Eu não sei quem tirou o carro de lá, não lembro do muro sendo consertado... Afinal, eu tinha 5 anos, não exijam detalhes da memória de uma criança de 5 anos. E sabendo que essa criança sou eu, fiquem felizes de eu lembrar da história... Mas eu lembro que não fiquei sequer de castigo. Afinal, eu poderia ter morrido.

E o mais importante de tudo. Aprendi uma lição. Que não foi :"nunca ouça seu primo e/ou nunca dê idéias à ele", ou: "nunca empurre um carro ladeira abaixo por simples ócio". Foi algo que aprendi para a vida (e para a proxima merda): Se for fazer uma merda, faça uma bem grande. Das de colocar sua vida em risco, ou acharem que você está em risco. Porque isso faz as pessoas ficarem tão felizes em ver que você está bem, que acabam esquecendo o que você fez. Como por exemplo, destruir só um carro...e um muro.



Praticamente Bonnie & Clyde



terça-feira, 4 de janeiro de 2011

De todas as lições...


Aprendi algumas coisas com os homens que passaram em minha vida.

Aprendi a gostar de salaminho, a pescar, a gostar de chá de boldo do Chile (e que ele é completamente diferente do chá de boldo. Carrega com ele a cruz do nome, mas é um incompreendido). Aprendi a gostar de ficar deitada na rede e a entender de Fórmula 1. Aprendi a jogar poker, a dividir o playstation e a gostar ainda mais de música estranha. Aprendi que praia pode até ser legal, assim como as longas caminhadas de mãos dadas. Aprendi a ser um pouco mais bem humorada quando acordo, a gostar de domingo, a me sentir confortável com o silêncio e a achar divertido fazer compras no supermercado. Quase me obrigaram a aprender a fazer minhas coisas sozinha, mesmo estando com alguém. Aprendi que sempre que passamos em blitz rodoviaria devemos ligar a luz e abrir as janelas, e que não devemos deixar os comprovantes do cartão de crédito na mesa do bar. Aprendi que, quando subimos uma escada o homem vai atrás e quando descemos vai na frente, para proteger a mulher. Aprendi que cuidar de homem é igual a cuidar de criança quando estão doentes, não se dá opção nem manda tomar o remédio, tem que enfiar goela abaixo, orelha adentro, dar banho, cafuné e cobertor. Aprendi a cozinhar seus pratos favoritos, ou perceber que eles gostavam mesmo era do gesto de carinho que é preparar um jantar pra quem a gente ama. Aprendi a gostar de fazer churrasco à meia-noite e a sempre perder nas brincadeiras porque perder é bem melhor que ver ele triste. Aprendi que um curió vale uma fortuna. Aprendi que homem também chora com desenho animado e são capazes de cozinhar se bem treinados (mas nunca serão capazes de limpar a cozinha depois). Aprendi que a única forma de entender a relação deles com relógios é compara-la à nossa relação com os sapatos, exceto pelo fato de que relógios são inúteis, sapatos não. Aprendi a gostar de café da manhã na cama, e de café da manhã na padaria e de fazer café da manhã. Aprendi que não consigo mentir nem pra dizer que o pior drink do mundo tava uma delicia e que pessoas anormais comem a batata frita depois de comerem o sanduiche, e não antes, como nós normais. Aprendi a não prometer que vou deixar de comer algo que amo só para agradar a outra pessoa. Cada um deles me ensinou a gostar de um super herói diferente, mas percebi que nenhum Wolverine ou Spiderman será mais amado por mim que o Superman. Aprendi a receber elogios inusitados e a gostar de queijos fedidos. Aprendi que bons pais nem sempre são bons filhos, bons filhos nem sempre são bons pais e principalmente que bons pais ou bons filhos não serão necessariamente bons maridos, mas que se forem péssimos como pais e filhos, serão obrigatoriamente deprimentes como seres humanos. Aprendi que é fácil um relacionamento sobreviver à distância, difícil mesmo é ele não sucumbir à proximidade. Aprendi a me reconstruir, lágrima por lágrima. Aprendi a ser mais boba, a ser mais eu.

Eles só não me ensinaram a me amar, talvez porque nem eles mesmos saibam como.